domingo, janeiro 11, 2009

A António

Como olhar para trás,
Ver placas que nunca existiram?
Ah, não ficas bem, meu velho,
Não ficas bem em memória.

Que poderes fatais, que sinergia,
Sofrestes em teus neurônios de gigante?
Teves a genial ideia de
Ser vento, soltar-te num pulso orgíaco
Ser o supremo orgasmo da velocidade.

Mas rio-me, meu pequeno, rio-me,
Talvez não saibas que nunca suportei
(com certeza não sabes disso, não é?)
Ser mais do que sou.

Sou um homem qualquer, amigo,
Ah, sou um homem amigo da rocha,
Sou aquele que envelhece e morre,
Sou aquele que não tem orgasmos,
Sou aquele que trabalha e chega em casa
E reclama das costas e quer a janta pronta.

Como poderei encarar a morte, velho amigo
Sabendo que precipitas-te lindamente
Que abraçaste a dor,
Que odiaste todo o universo em dois segundos?

Eu fumo. Fumo porque sei que só posso morrer um maço de cada vez.
Minha mãe ralha comigo. Deixe-a ralhar. Morri no vício.
Tive de aprender a viver com a morte, encontrei-a
Na ponta do alvíssimo cigarro em brasas.
Deixei ele no chão, a queimar-se
Olhei ele queimar como se come uma barra
Do melhor chocolate que há.

Mas sei que não fumavas. Ah, meu amigo que sabe,
A memória é um suéter que ficou pequeno.

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