quarta-feira, setembro 23, 2009

A hora do intervalo é a que dura: só o eterno explica o peso que há no peito do corpo que acordou e viu que já era tarde. Percebe que todos os ônibus passaram - a firma já fechou e o escritório já conta as perdas. As pessoas se recolheram - a novela das oito acabou e os olhos abertos não dão Ibope. Dois namorados se encontram cansados na hora indigente que roubaram para o amor. Nos olhos dela o corpo percebe a rejeição e o fim que se anuncia no entretempo.
É manhã, mas eu não respiro o odor do começo - a trilha de sangue que seguem todos. É manhã, o sol não nasceu, só os autômatos levam nossos nomes em seus corpos de poeira. Ontem anunciaram a primavera, mas hoje a chuva anunciou céus pesados e é o chumbo que chove nas gramas.
De novo, constato? Nenhuma flor nasceu na rua. Um sabiá range sobre uma folha de palmeira. O verde tem a cor do alumínio. Não, poeta, você não acordou - não acorde que o tempo é de dormitar. Antes dormir para sempre do que acordar nessa terra de aço: acordar é perder o bonde do que se desperta.

sexta-feira, setembro 18, 2009

Você se sentava no sofá, e tua presença era tão certa quanto o azul. Mas o sofá está ainda na sala, e você já não tem mais aquela fala incisiva - você já não tem mais nada, pai, e as falas que te destino caem em ouvidos mortos. Mas não tenhamos remorsos: as pessoas têm menos ouvidos do que as paredes contra qual esmurramos nossas cabeças.
Suponha, pai, que a vontade de dizer te anime a ponto que você rompa seu caixão e tenha vontade de gritar.
Não grite.

domingo, setembro 13, 2009

May I have another slice, please?
O corpo se joga e abraça a queda - abraçá-la é pedir para que o segurem e lhe digam que está tudo bem. Se o corpo é acolhido ou se o corpo se espatifa no chão, tanto faz - a miséria está no ato de jogar-se quererendo mais do que o solo que nos arranha.

Ninguém pode jamais querer esse solo que arranha.